Tese de doutorado pela Faculdades EST (São Leopoldo, RS).

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O protestantismo brasileiro revela uma paixão por Israel e pelos símbolos judaicos, o que pode ser denominado “judeofilia” – o amor pelos judeus. Esse fenômeno foi verificado em manifestações de sionismo cristão, uso pelos protestantes de símbolos judaicos como a bandeira de Israel, menorá, shofar e talit, além da celebração de festas judaicas em igrejas das mais variadas vertentes do protestantismo. Partindo da compreensão de que o amor por Israel pelos protestantes deriva de seu amor pela Bíblia, e que as tradições judaica e protestante têm neste livro a Escritura Sagrada comum, busca-se na hermenêutica filosófica, especialmente em Paul Ricoeur, o suporte teórico para analisar o fenômeno. Três variáveis são fundamentais: a Bíblia, entendida como obra literária plena de significados, polifônica de sentidos e ressonante em mensagens, que fornece um potencial de metáforas e imaginação para leitores de todos os tempos; a experiência humana no tempo, marcada pelo seu caráter simbólico, litúrgico e narrativo, que resolve as aporias do tempo e o caos da existência por meio da organização narrativa tanto pela histórica como pela ficção; e seu produto final, as identidades narrativas individuais e coletivas, as quais produzem e entrecruzam narrativas para compreensão da realidade e de si mesmos. Na análise da história do antigo Israel e da formação do cânone da Bíblia hebraica, bem como a história do cristianismo e da formação do cânone da Bíblia cristã, percebem-se duas orientações hermenêuticas distintas, as quais separaram drasticamente as duas tradições: a judaica, com identidades baseadas no Talmude como interpretação da Torá; e a cristã, com identidades baseadas em Jesus Cristo como realização da Bíblia hebraica. Tal separação constituída ao longo do tempo resultou em animosidade e até violência de cristãos contra judeus. Na história recente, a virada hermenêutica do protestantismo, na qual a Bíblia ganhou estatuto de autoridade única, acompanhada de uma hermenêutica literalista radical, os judeus e Israel ganharam atenção no que se refere à escatologia realizada – o já do Reino de Deus – e ainda aguardada – o ainda não do Reino de Deus. O retorno dos judeus à Terra Santa, bem como a organização do Estado de Israel com um mito nacionalista fundado na tradição bíblica, trouxe aos protestantes a aparente confirmação histórica de suas expectativas escatológicas tanto para o presente como para o futuro – o que explica a judeofilia emergente apenas a partir do final do século XIX. Trata-se de um entrecruzamento de narrativas de judeus e protestantes a produzir o fenômeno da judeofilia. Entretanto, como as comunidades do judaísmo e do protestantismo permanecem separadas, trata-se de uma paixão por um Israel imaginado pelos protestantes de acordo com a sua própria hermenêutica da Bíblia.

Palavras-chave: CRISTIANISMO E HISTÓRIA NA AMÉRICA LATINA; Judeofilia; Hermenêutica filosófica; Paul Ricoeur; Bíblia; Judaísmo; Protestantismo